segunda-feira, novembro 29, 2010

Vai-se construindo...

Já aqui abordei anteriormente, a manifesta falta de pudor de quem constrói e de quem permite que se construam os edifícios incaracterísticos que despontam um pouco por toda a ilha - encontrando-se no Carapacho os exemplos mais flagrantes -, mas nunca será de mais escrever mais umas linhas a esse respeito, em forma de desabafo.
Ainda que a arquitectura tradicional da Graciosa seja - á imagem da arquitectura tradicional de tantos outros lugares – de uma simplicidade estóica, constitui-se como marca indelével de gentes e vivências, também elas simples, também elas pobres. Essa é a sua imensa riqueza e é esse resultado de um árduo labor, onde a pedra era recolhida nos campos ou arrancada á rocha viva junto ao mar, onde as madeiras eram trabalhadas á mão e as telhas cozidas em vetustos fornos, que importa preservar.
Hoje, demolem-se esses edifícios centenários, preteridos por aberrações em betão, horríveis em qualquer parte do mundo e que sobressaem por entre as discretas e alvas casas da ilha. As razões básicas para esta tendência, serão antes de tudo, de cariz sociológico: a casa, á semelhança da pessoa, tem de exteriorizar um modo de vida e um status, que correspondam, senão à pessoa, às suas aspirações sociais e ao “parecer bem” perante os seus pares. Essa propensão traduz-se nos tristes exemplos de arquitectura de gosto duvidoso que começaram a despontar nos últimos anos, tentativa infeliz de exteriorizar conforto e, bem vistas as coisas, aquele american way of life que sempre se invejou. Estas edificações adoptam modelos desenquadrados da realidade insular, pintam as fachadas com cores incaracterísticas, imitam alvenarias e cantarias de basalto sem nexo, decoram os jardins com pias em pedra e pesos de lagar rapinados de algum lugar. A lista de anormalidades é extensa. Que se proíbam estes atentados, que se imponham cérceas em consonância com o enquadramentos, que se imitem as fachadas antigas e as coberturas em telha de canudo, que haja bom gosto e que – enfim – se respeite o Plano Director Municipal.

quarta-feira, novembro 24, 2010

Mérito

A Junta de Freguesia de Nossa Senhora da Luz já tem uma página na Web. Exemplo de trabalho, transparência e dedicação, a seguir por Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia por este Portugal fora.

http://freguesialuz.pt.vu/

terça-feira, novembro 23, 2010

Incompetência

No site da Rádio Graciosa:

"A Câmara Municipal de Santa Cruz da Graciosa vai indemnizar a empresa Somague em 280 mil euros, pela empreitada de Construção do Pavilhão Desportivo e de instalações técnicas de electricidade, telefones, gás, águas e esgotos, para além de arranjos exteriores no Complexo Desportivo de Santa Cruz.

Esta verba resulta de um acordo entre autarquia e a empresa que construiu o Pavilhão Municipal, pois devido a erros que havia no projecto, este foi atrasado em um ano.
Segundo o presidente da Câmara Municipal, Manuel Avelar Santos, está a pagar-se, não por trabalhos a mais, mas por erros com que a empresa se deparou no projecto e que obrigou à sua permanência na ilha por mais um ano.
O Pavilhão Municipal, custou cerca de 2 milhões e 280 mil euros à autarquia Santa-Cruzense."


1) Erros de projecto que custaram 280 mil euros deviam ser pagos pelo projectista que concebeu o pavilhão e não pela autarquia.
2) Um ano para emendar erros de projecto. Depreendo que o empreiteiro, ao iniciar a obra, se terá deparado com o projecto de uma barragem. Esse ano foi o tempo que levou a transformá-la num pavilhão.
3) A Somague, ao concorrer à empreitada e assumir o cumprimento do caderno de encargos, não terá tido um gabinete de projectistas que avaliasse o projecto do pavilhão e lhe detectasse e corrigisse as falhas?

Custa-me ver o dinheiro de todos nós a arder num fogo ateado por um incompetente.  



domingo, novembro 14, 2010

Fotografias da Graciosa

Baía da Barra, em Santa Cruz, vista do Monte d´Ajuda, enquanto se aguarda o projecto da marina que decerto a descaracterizará irremediavelmente.

segunda-feira, novembro 01, 2010

Viajar: Planalto Mirandês

Sendim. Sobre a lareira do restaurante, o retrato da velhinha Ti´Gabriela, sorridente e barbada, abençoa-nos a refeição. Na mesa, um naco de carne maior do que tudo o que comi até hoje, esvai-se em sangue. Pego no garfo e na faca. Vai dar luta. Chamam-lhe Posta Mirandesa e segundo a tradição foi a velha senhora do retrato que a refinou e a deu conhecer ao resto de Portugal.

O planalto mirandês é terra de Homens duros. Só sendo duro se consegue deglutir este manjar. Eu fico-me por metade. A posta é apenas uma das singularidades desta terra Transmontana que evoluiu arredada do resto de Portugal. As terras de Miranda cheiram a ancestralidade, a costumes que se perderam no resto do mundo mas que aqui sobrevivem com alguma pujança. A língua Mirandesa é exemplo paradigmático. Não é que se ouça nas ruas, mas de quando em vez chegam-nos aos ouvidos palavras desse dialecto arcaico, mescla das duas línguas ibéricas. Na música, a gaita de foles mirandesa, constitui-se como símbolo máximo desta terra. E os pauliteiros, que na dança perpetuam a memória dos guerreiros que por aqui se digladiaram.

Perdi-me nestas terras antigas que pontuam o planalto, Sendim, Palaçoulo, Duas Igrejas, Constantim, Prado Gatão, Miranda do Douro, Mogadouro, entre outras cujos nomes não me ocorrem mas que resistem orgulhosas na sua diferença, cunho de uma identidade milenar profundamente telúrica e avessa a estandardizações. E nós que nos deixamos enfeitiçar por reminiscências de mundos perdidos que vivem nos documentários e no cinema, desconhecemos que temos aqui tão perto esse mundo maravilhoso.

A minha estadia foi curta, mas fiquei fascinado por esta região, onde se chega a custo por estradas velhas e sinuosas e que, de algum modo, ajudaram a preservar esse recanto ancestral da nossa memória, o Portugal mais profundo e verdadeiro.