segunda-feira, abril 13, 2009

Estranha forma de construir

Foto de A. Brum Ferreira

Os centros urbanos, independentemente do seu cunho histórico, não são imutáveis. São um organismo vivo, em contínua construção e desconstrução, numa infindável multiplicidade de formas e feitios, verdadeiro palimpsesto construído por quem os habita ou habitou. Assim a leitura destas realidades, construídas ao longo dos tempos, será sempre relativa. Se há quem veja os centros históricos como um santuário onde se perpetua a realidade de um passado mais ou menos distante, também há quem veja, por detrás de fachadas eruditas, tectos de telha de meia cana e dos cunhais finamente lavrados na pedra dura, mil e uma maneiras de cortar com a tradição e deixar marca indelével na paisagem urbana, com todas as implicações que daí possam advir. Estas letras, não poderiam deixar de referir-se, claro está, ao projecto de ampliação do Museu da Graciosa.

A obra de ampliação do Museu gerou polémica no seio da comunidade Graciosense por se tratar de um projecto dissonante da restante arquitectura da vila de Santa Cruz, classificada e de construção condicionada. Nem mesmo as alterações efectuadas a posteriori ao projecto, aliviaram as enormes diferenças entre o novo edifício e os pré-existentes.

Pessoalmente, discordo da opção arquitectónica adoptada, embora lhe reconheça algum valor, mas acima de tudo, temo que isso abra precedentes que possam pôr em causa integridade e a harmonia de um centro histórico de matiz erudita e o transfigure irremediavelmente. As casas nobres do centro de Santa Cruz, debruadas a cantaria de basalto, de portas vetustas e telhados antigos, correrão o risco de se verem sujas pelo betão, pelas janelas e portas em alumínio, pela telha marselhesa e por demais facilitismos construtivos que a contemporaneidade pôs ao nosso dispor.

Seria decerto mais consensual, construir um edifício que respeitasse o património edificado e nele se integrasse, com elementos arquitectónicos que reflectissem a realidade local e não um conjunto de paredes em betão amorfas e que nada nos dizem. Poderíamos estar a enganar as gerações futuras com marcas que não são as do nosso tempo, mas ao menos não enganávamos a memórias das gentes que com o seu árduo e exímio labor nos legaram esta bela vila.

1 comentário:

João Bruto da Costa disse...

Com a devida vénia:
assino por baixo!