quarta-feira, novembro 22, 2006

Na Linha do Douro

Foto da autoria de Vitor Pedro Nunes

Já perdi a conta ao número de vezes que percorri a linha do Douro, entrando numa carruagem no Porto e saindo quase quatro horas depois no apeadeiro de Freixo de Numão-Mós do Douro, perdido entre os socalcos de granito, plantado á beira rio tal como as vinhas e as oliveiras que pontuam aquela paisagem...
Perdemos o Douro pouco depois do Porto e vamos encontrá-lo novamente pouco antes de Mosteirô, ele acompanha-nos até ao fim da linha e nós não conseguimos tirar os olhos dele e das arribas que ele moldou, depois tornadas em socalcos pelas mãos laboriosas dos homens. Os socalcos estendem-se sem interrupção até ao Pinhão, pouco depois da Régua, e daí até á foz do Tua surgem de tempos a tempos fragas a pique que interrompem o padrão da paisagem. É a partir da foz do Tua que encontramos o Douro rude, encaixado num vale que se despenha abruptamente nas suas águas e que o Homem não conseguiu moldar. O ponto alto da viagem dá-se quando chegamos ao cachão da valeira, outrora inultrapassável, hoje domado por uma discreta barragem. Atravessamos um túnel e o comboio quase que se torna barco; do outro lado a linha eleva-se poucos metros acima da água, e erguendo-se abrubtos á nossa volta montes graníticos cobertos de árvores mirradas. É uma paisagem solene... os passageiros levantam-se e colam-se ás janelas uns deslumbrados, outros nem tanto (afinal aquilo sempre esteve ali...).
Pouco depois a linha muda de margem, já falta pouco para o destino. A paisagem parece que se recompõem e começam a surgir novamente casas, socalcos e vinhedos. Passamos a mítica Quinta do Vesúvio, construída pela Ferreirinha (ainda há quem veja o seu fantasma passeando-se entre as vinhas que tanto amou). Os tunéis sucedem-se: aqui o granito despiu-se e aflora á superficíe, as gentes que construíram esta linha tiveram um trabalho dos diabos... Por fim surge o nosso apeadeiro, discreto, quase que nem damos por ele. A linha acaba ali á frente, no Pocinho, uns quilómetros depois. Saímos e nem vivalma... existem duas casas aqui á volta, por sinal abandonadas. Embora o apeadeiro se chame Freixo de Numão, esta vila situa-se a 12 quilómetros, sempre a subir por um caminho que serpenteia por entre os montes que fazem esta paisagem. Já me aconteceu ter de esperar aqui durante horas por boleia, por companhia temos esta paisagem deslumbrante, das mais belas de Portugal, que mais podemos querer?

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