segunda-feira, novembro 27, 2006

A casa tradicional da ilha Graciosa (parte V)

A “casa de empena”, independentemente da sua tipologia e da sua dimensão, fecha-se sobre si mesma, é no pátio em frente á fachada principal, quase sempre empedrado, separado da via publica por um muro que por vezes atinge a altura da fachada, que decorre muita da vida familiar.
A habitação deve ser por si só uma unidade auto-suficiente, como tal é servida por uma série de construções como a cisterna ou o tanque, a “burra” do milho, o galinheiro e o curral dos porcos, a horta e o pequeno curral com laranjas e limões e outros que apoiam a actividade agrícola como é o casos dos alpendres, dos palheiros e do lagar.
A cisterna e o tanque são peças fundamentais para a vida do Graciosense uma vez que a ilha é extremamente seca e as poucas nascentes não possuem um caudal significativo. A água das chuvas é recolhida por meio de caleiras cerâmicas que circundam a casa sob os beirais e conduzem a água para a cisterna ou tanque onde é armazenada.
A “burra” do milho é um tipo de sequeiro em madeira que surge um pouco por toda a ilha e evidencia a importância que o milho adquiriu na alimentação destas gentes. Trata-se de uma estrutura prismática com base rectangular assente em 4 ou mais pilares de basalto onde se armazena o milho em molhos e, por ser entendida como uma estrutura nobre é, juntamente com a cisterna, construído em frente á habitação.
O galinheiro e o curral dos porcos, de pequena dimensão e onde se criam os animais que vão alimentar a casa durante o ano, surgem sempre junto ao quintal, nas traseiras da habitação. É frequente a retrete ser construída junto ao curral dos porcos, partilhando o lameiro.
Os palheiros são construções em alvenaria, geralmente sem reboco que se destinam ao armazenamento de palha ou lenha. O alpendre do carro, construído em moldes semelhantes ao do palheiro destina-se á protecção do carro de bois é á recolha de alfaias agrícolas.
Por ultimo o lagar e a adega, que geralmente surgem isolados e junto ás vinhas, podem também surgir no seguimento destas casas.
Para completar o quadro resta dizer que estas habitações se integram, com já referi, na orla de pastagens e cerrados, base de toda a actividade agrícola da casa e o seu principal sustento.

Sendo o pão de trigo e o pão de milho uma das bases da alimentação do povo da ilha, rara era a casa, por mais exígua que fosse, que não possuía um forno, sinónimo de que as pessoas que ali moravam não passavam fome. O forno com a chaminé acoplada surge como um bloco saliente, de fisionomia quadrangular e coberto com telha nas traseiras da habitação. Á chaminé corresponde o espaço do lar que se pode apresentar com os poiais desenvolvidos em U, formando uma caixa que se distingue do resto da cozinha, ou bipartido, integrando a porta do forno e a borralheira numa das paredes da habitação. As chaminés apresentam formas diferentes, desde volumosos paralelepípedos que provavelmente correspondem a uma cronologia mais antiga até á chaminé de mãos postas, de silhueta graciosa e que é muito comum nesta ilha.

O interior da casa rural reflecte as condições de vida dos seus moradores. O tipo de casa que tenho vindo a tratar, pertencia quase sempre a famílias humildes e numerosas, a jornaleiros com baixos salários e que se viam forçados a dispensar os luxos que se podiam encontrar nas “casas de alto e baixo”, sinónimo de um outro status.
A cozinha resumia-se ao essencial, uma mesa e algumas cadeiras em madeira, um ou outro alguidar em barro, uma armário ou copeira onde se guardava a louça e os talheres e a indispensável talha, sempre cheia com água da cisterna. O quarto de dormir era também sala de estar e era normalmente dividido em 2 áreas por meio de um tabique ou de uma cortina. Uma destas aéreas correspondia ao leito do chefe da família e da esposa e a outra para os filhos. Os poucos luxos a que uma família de reduzidas posses podia ter como fotos, quadros, a mobília mais fina eram colocados nesta divisão, onde também eram recebidas as visitas.

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